domingo, 19 de outubro de 2008

Leitura Dinâmica

Todas as páginas estavam riscadas, o livro estava amarelado e, talvez, tivesse testemunhado a passagem do tempo nas mãos de seus leitores. Foi maltrado mas não reclamou. Livros reclamam a voz do autor. E o amor casual do leitor.

Pude ver de longe que as mãos trêmulas passavam as páginas, mas era nítido que elas já tinham sido lidas várias e várias vezes. Parou numa delas, de repente, começou a lagrimar. Fiquei sem jeito do outro lado da sala - meio desconcertado por testemunhar um momento quando alguém sintoniza finamente o jeito de outra pessoa pensar, ou, simplesmente, sente o que outro sequer sentiu. Uma dor de dublê. Um lapso do acaso. Um corte frio na pele quente.

Vi que a pessoa anotou algo no último espaço que restava. Limpou os olhos. E saiu da sala deixando-o.

Levantei correndo, meio sem entender aquilo que não pareceu exatamente um esquecimento. E sim um desquite. Quando cheguei vi que o livro estava aberto num capitulo com o titulo "dor". Sem desmarca a página, olhei com pressa e já me encaminhando até a porta para ver se a pessoa ainda estava por perto e percebi que os capitulos tinham titulos correlatos "medo", "angústia", "solidão" e por ultimo "descaso".

Na anotação deixada esta escrito, pude perceber em tinta ainda fresca: "agora ele é seu!"