quarta-feira, 9 de abril de 2008

O cego, o franco atirador, o policial e o ladrão de celular.

Deu um pulo da cama quando percebeu que não enxergava nada. Esfregava os olhos freneticamente e aos gritos chamou sua mulher, que escova os dentes. "Eu não tô enxergando, eu tô cego... Cego!!!" Ele chorava e gritava e esperneava e a mulher não sabia o que fazer para acudir. Chorava também ao ver aquele homem que sempre a maltratou, que sempre a diminuiu, que sempre lhe deu homens imaginários, sendo calcinado pelo destino. Ela tentava, mesmo assim, dar-lhe algum conforto, tirando de onde nada mais existia. Segurava-o e beijava a cabeça que o tempo deixou alva.

[...]

Ele finalmente arranjou um tempo para ir ao dentista. O estacionamento estava difícil, teve que deixar o carro um pouco longe do consultório. Até para atravessar a avenida era uma tarefa hercúlea. Demorou um tempo para fazê-lo, e quando conseguiu, um motoqueiro quase lhe quebra as pernas. Ele desviava do motoqueiro, que parecia tentar dizer-lhe algo. Quando alcançou a calçada, percebeu que o motoqueiro estava seguindo-o, e mais do que isso, estava lhe apontando uma arma.

[...]

O policial sempre foi respeitado na coorporação. Um exemplo de cidadão. Seu uniforme sempre hermeticamente passado e limpo. Seus sapatos negros e lustrosos. Era o orgulho da polícia militar. Nesse dia, ele estava de serviço e fazendo a ronda por uma das ruas movimentadas da cidade. Olhava para a ordem das coisas, gostava de ver as pessoas tranquilas. Era bom trabalhar para a poílicia. Ele sorria por dentro. Ele sentia-se feliz. E esse sentimento já lhe dominava seus sentdos, quando a central avisava sobre uma tentativa de assalto que terminara em morte. Era perto de onde ele fazia sua rota.

[...]

O homem, agora cego, agarrava-se com força naquela que sempre foi uma grande parceira. Seus olhos vermelhos de tanto apertar, estavam sem luz. De certa forma ele começava a experimentar a escuridão onde aquela mulher sempre viveu. A metáfora da vida, pulsava naquele quarto de casa classe média. Estava mais calmo. Mas a angústia de quem não pode ver é grande, só que bem menor de quem pode, mas prefere ficar na escuridão, pensava a mulher.

[...]

O policial chegou no local da tentativa de assalto. De longe viu o corpo de um homem. Outras viaturas estavam paradas e próximas a elas, estava aquele que tinha arranjado um tempo para ir ao dentista mas que acabava de matar outro homem que tentou roubar-lhe o celular. Nas mãos tinha um 38 , revolver que ganhara de seu pai, logo que recebeu seu porte de arma. Quando o policial chegou próximo ao corpo, um frio lhe percorreu a espinha, o morto no chão era seu irmão caçula, quase que não pode conter algumas lágrimas.

[continua...]

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